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quarta-feira, janeiro 31, 2007

As intermitências de um blog

De intermitências, inconstâncias, pausas e avanços se faz este blog. O blog de um outsider, claro está. Como sempre, um blogger que não se vê ao espelho como tal. Que gosta dos blogs dos outros mas preferiria de bom grado lê-los em papel. Um blogger que critica a geração ligada à máquina para sobreviver. O que é certo – tão certo como estas palavras passando à frente dos meus olhos neste monitor – é que ele aqui continua. Disparate. Continuamos. Nós cá continuamos, quase sempre desabafando, quase nunca piadetizando para fidelizar audiências. Sempre nós. Às vezes fartos, desejando que a palavra «nós» seja finalmente um plural assumido. Outras vezes, conformados – raramente, muito raramente. São quatro anos. 4. Às vezes, esqueço-me de que há tantas outras histórias para trás…


Damon at 6:47 da tarde


Quando andamos na escola, contam-nos a história d’«Os Três Porquinhos». Mais tarde, deixam-nos de boca aberta quando nos falam das extraordinárias semelhanças entre o nosso organismo e o deste animal, ávido apreciador de bolotas e banhos de lama – terá sido esta a origem dos spa’s, tão na moda? E depois, mais crescidos e teoricamente educados no meio da civilização ocidental, empregamos o seu nome para insultar este ou aquele condutor com quem embirrámos, acompanhando o poema «Seu porco!» da sempre extraordinária buzinadela. (ler resto aqui)

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Damon at 5:05 da tarde

terça-feira, janeiro 30, 2007

Televida

Senta-te no sofá,
Espera que a tv adormeça,
Depois reza a oração do dia
E pressiona o botão vermelho.
Tudo será verdade.

Os teus olhos
Serão cogumelos anónimos,
Borboletas-traças devoradoras
De todas as cores
De todos os dias
Perdidos no mar,
À pesca de um espelho.

Pobre alma daltónica,
O espelho tem estado sempre
Em cima do napron cor-de-rosa
Com bordados em forma de andorinhas,
Por cima do móvel carunchoso,
Onde guardas as pratas,
Onde guardas as fotos,
Onde guardas os bichos
Para que não te comam,
Por enquanto.

Senta-te no sofá,
Espera que a tv adormeça,
Fecha os olhos que tiveres
E espera o nascer do sol.
Ele há-de vir, a cores
E com vontade de te ensinar.

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Damon at 7:10 da tarde

domingo, janeiro 28, 2007

Estou num restaurante asiático, daqueles que agora já não são chineses nem japoneses nem coreanos, juntaram-se todos no mesmo tacho. Então, ela entra, ou talvez já lá estivesse e se tenha posto de pé – o simbolismo de uma pessoa sentada não é o mesmo. É como se entrasse, como um sol esperado há muito. E não há qualquer pretensão romântica nesta expressão. Ela não é particularmente bonita. É um ser humano dourado de um cabelo que estica os braços e nos toca, despertando-nos do Inverno. É magra, delicada, sobriamente vestida a preto e branco, de mãos dadas com a sua pele. Não é assim tão alta para os padrões da sua terra – para aí 1m90.

Senta-se. Traz um tabuleiro com o prato reflectidamente decorado de alimentos saudáveis. Come com calma. Mastiga o prazer de estar sentada a contemplar o branco atípico das paredes – de mãos dadas com a sua pele.

É então que, cintilante, o pequeno tesouro se ergue nas suas mãos como uma pomba revelada pelo ilusionista. Um pequeno livro, Penguin de certeza. Começa a ler e esquece o prato e a comida. Esquece a coca-cola que se esvai numa hemorragia de gás. Esquece o empregado que levanta os pratos e atabalhoadamente pergunta se «quele soblemesa». Esquece o mundo. Vira as páginas.

Entretanto, vou encher o prato e passo por ela. Minutos depois, um cliente berra com o empregado por este o ter salpicado de molho de soja.

Depois, entra a polícia para prender um velho ditador sul-americano que comia chop suey como quem escolhe entre Estaline e Hitler.

Entretanto, uma cliente perde os sentidos e estatela-se, abrindo uma frincha no chão com o baque dos seus anéis. É dessa forma que se descobre um antigo túnel escavado no tempo em que Vale e Azevedo era presidente do Benfica.

De seguida, o Rancho Folclórico da Casa do Povo de Guilhufes irrompe pelo estabelecimento acompanhado pela Orquestra Sinfónica do Bahrein, para tocar uma versão de «Saturday Night Fever».

Depois, dá-se um golpe militar que coloca no poder o General Motors, seguido do respectivo contra-golpe que devolve o governo ao Capitão Iglo.

Entretanto, descobre-se que um dos cogumelos chineses é, afinal, atómico e, atónito, o vegetal explode em pleno restaurante.

A seguir, o mundo acaba.

Ela fecha o livro. Fica dois segundos a olhar para o desenho da história no ar, deixa o dinheiro em cima da mesa e sai, sorridente, para ir dar um passeio.

Damon at 6:17 da tarde