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Os nervos Estou numa esplanada. Sim, uma esplanada. Daquelas com cadeiras e mesas e chávenas que fazem ruídos chatos, com ritmos chatos e as pessoas chatas conversam e têm a ousadia de rir e a lata de mencionar a palavra proibida. Que lata, a das pessoas: virem para o pé de mim rir e falar de uma palavra de que não se fala, sente-se, consente-se, combate-se. Por que é que está vento? Por que é que o céu ameaça ruir em cima de mim e do meu portátil sob a forma de água que ainda por cima cai suja, por causa dos americanos e do seu desrespeito pelo ambiente. A culpa é toda dos americanos. E do Durão Barroso. E do Paulo Portas. Eles têm culpa do vento e da chuva e da esplanada e da palavra proibida. Devia haver uma lei que proibisse a proibição de palavras. Assim, talvez ninguém a dissesse. Talvez mais gente a sentisse, a consentisse, não a combatesse, antes combatesse por ela. Talvez mais gente se sentasse por aqui, talvez eu não. Talvez eu voasse e corresse e fosse até à praia sentir o sabor da espuma do mar e da saliva. Não, eu não menciono a palavra proibida. À volta da esplanada, só há prédios e carros. Detesto carros cinzentos. E ainda por cima todos os carros são cinzentos, agora. Detesto-os. Eu tenho um carro cinzento. O meu pai tem um carro cinzento. Conheço muita gente com carros cinzentos. Bem, depende do tom de cinzento, então. E os prédios também são cinzentos. Limpo as lentes dos óculos. Talvez haja cinzento a mais do ponto de vista dos meus olhos. Não gosto dos meus óculos. Têm a armação preta, que é uma forma de cinzento mas visto à noite. Tenho medo da noite. Tenho medo das pessoas coloridas que escondem em si a loucura e têm a lata de dançar e rir e contar anedotas. Às vezes, mencionam a palavra proibida. Raramente a sentem, consentem ou combatem por ela. Conduzem os seus carros cinzentos até ao ponto de encontro. Entram em prédios cinzentos e julgam que lá por se cobrirem de tecidos às riscas coloridas e dançarem ao som de ritmos mais chatos que o das chávenas a bater em cima da mesa da esplanada… Julgam que lá por contarem piadas e rirem e falarem na palavra proibida como quem fala num quilo de carne picada para hamburgers… Julgam que lá por eu ter medo de que o mundo agora seja assim, uma picadora gigante e de que a palavra proibida venha em pacotes que se atiram à cara da outra pessoa (vulgo monte de carne picada) em forma de piropos que metem nojo aos meus olhos castanhos que vêem cinzento… Eles julgam que lá porque eu tenho medo deles, me assustam. «Don’t mention love», diz o Morrissey, a única pessoa com um feitio pior do que eu. Desculpem lá, são os nervos. Damon at 7:16 da tarde
Damon at 2:27 da tarde Damon at 6:37 da tarde
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outras praias
where words come together as waves, blue and beautiful, dying in the whiteness, but repeating themselves like music notes, from sunrise to sunset to sunrise again. um livro: «Saudades de Nova Iorque», de Pedro Paixão. um filme: «Memento». um disco: «King of limbs», Radiohead. |