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sábado, abril 19, 2003
Saudades. Muitas. É tão fácil ter saudades tuas...

Damon at 2:33 da manhã

sexta-feira, abril 18, 2003

A avó Helena gostava muito da Páscoa. Era capaz de se levantar às sete da manhã, no domingo, para coordenar as operações de recepção ao Compasso que só viria por volta do meio-dia. Mas ela andava de um lado para o outro e eu, ouvindo os passos matinais dela no corredor, saltava da cama para a ajudar. Lá fora, colhiam-se pétalas de flores multicoloridas que se espalhavam pelo chão indicando o caminho aos homenzinhos vestidos com roupas engraçadas. Chateava-me vê-los a calcar as flores. Chateava-me vê-los destruir a beleza da nossa obra. Cá dentro, preparavam-se pratinhos com biscoitos e salgados e fatias de pão-de-ló que se punham na Sala das Visitas que praticamente só era aberta uma vez por ano, nesta altura. Eu gostava de dispor os biscoitos nos pratos, dando-lhes a forma de caras estranhas. Depois, esperávamos. Às vezes, eu pegava na bicicleta e ia ver por onde andavam os nossos amigos. Mal os via lá ao fundo, pedalava para casa a anunciar que estavam quase, e nunca deixava que me vissem antes de chegarem a minha casa. Dava-se valor a esses momentos simples, a essas ocasiões simbólicas que, para mim, puto que ainda sorria por ver nascer o sol, não eram religião, eram família. Lembro-me que a única vez em que as tendências anti-clericais do meu pai prevaleceram, fomos todos almoçar fora. Quando chegasse perto de minha casa, o compasso não teria flores que lhe indicassem o caminho e o portão estaria fechado e a casa vazia. Íamos no carro e duas caras separadas pela idade e unidas pelo espírito mostravam-se mais tristes do que as outras - a minha e a da avó Helena. Não tinhamos conseguido provar ao meu pai que aquilo não tinha nada de religião. Era família que aquilo queria dizer, era união e sorriso e um dia diferente no ano. Almoçámos num restaurante bonito e no rosto da avó Helena não havia o sorriso que lhe víamos em casa. Nesse ano, dois dias depois de eu ter completado 12 anos, a avó Helena faleceu. Desde então, o domingo de Páscoa é um dia em que a casa está fechada e nós vamos na estrada, a caminho de um qualquer restaurante, talvez fugindo das dores de cabeça que normalmente perturbam quem não tem a consciência tranquila.

Damon at 6:20 da tarde

quinta-feira, abril 17, 2003

23

I've been staring at the sea,
Waiting to see you emerge, white and stars,
Every wave would be a new hope,
Every storm a means to hide the tears
I shamelessly cried.

23 says a lot to me,
Most of it, sadly,
Words of loving despair.
It sings a few songs,
And it looks like it hasn't sung
The final one.

I've been sat here, amongst the grains,
Watching the waves, giving them names
Of young girls, probably too pretty
For I am but a soul
And souls never win, these days.

23 times I've been the wind
That blows over a home-baked cake,
With applause and gifts and smiles,
And ephemeral style,
Like the time hasn't flown,
Like the waves haven't grown
To later die in sandy beds,
Like I haven't been here all the time
And only one day in the year to make me cheer.

Give me 23 days to compensate
These 23 years of a tricky fate.

Damon Durham.

Damon at 12:23 da tarde

terça-feira, abril 15, 2003

The Universal dos Blur está para mim como «A Portuguesa» para os cidadãos portugueses (excepto o Deco, para quem a única «Portuguesa» é a «dos desportos», lá no Brasil, né?). É a referência óbvia a um ano que deixou marcas, talvez o último dos anos felizes, quando havia festas por se sair à rua e parecia estar sempre sol. 1995. Para além disso, são os coros que se arrastam em violinos e na guitarra muito britpop (estávamos na altura dela mais do que nunca) de Graham Coxon. É a letra que critíca e ao mesmo tempo escreve poemas na voz mais jovem (pré-Gorillaz) de Damon Albarn. Quando The Universal toca, eu levanto-me em sinal de respeito pela canção da minha vida, a única de que nunca me cansei, das poucas que me fazem sorrir. «It really really really could happen...» Damon Albarn, o que é que estás para aí a dizer?...

Damon at 3:27 da tarde

segunda-feira, abril 14, 2003

O homem e a vela

Nunca tive muito jeito para manter as velas acesas. Do fundo da minha garganta emergia sempre de alguma forma um sopro que acabava por extinguir a fragilidade do seu lume. Para mal dos meus pecados, fui aquele que acabou por se apaixonar por uma vela. À falta de outra companhia, receoso de ficar no escuro. A história é esta.
Uma noite, faltou a luz. Vagabundo dentro de minha casa, tropecei em livros que tinha aos montes espalhados por todo o quarto, em substituição dos móveis e dos retratos de família. Encontrei-a, por estrear, dentro de uma gaveta onde também havia contas de supermercado, senhas de autocarro e uma caixa de fósforos. Como se a minha vida dependesse daquele gesto, empenhei-me ao aproximar o lume do fósforo do fio morto que me pedia vida. Quando acendia vela, a casa renasceu no movimento das sombras e eu sentei-me no espaço livre da cama, à espera de uma electricidade dona do mundo, inútil sem o seu brilho. Mal sabia eu que haviam de passar tantas horas até que o sol nascesse de novo nos candeeiros do meu quarto. Enquanto esperava, observei as suas linhas, o fio de suor mole que descia pela sua pele até secar na madeira da cómoda, solitário móvel, imóvel na sombra do quarto. Apaixomei-me. Verti lágrimas de estranho amor por aquele brilho, aquela luz que me beijava os olhos num reflexo quente. Deitava-me a observá-la derretendo-se por mim. A sua chama parecia mais forte, mais viva e colorida, dançava para mim mas nunca perdia a força, nunca deixava de ser sol, por muito pequena e frágil que fosse. Eu sorria, esquecido da ausência de electricidade. Até que, após adormecer embalado pela nudez da minha chama, acordei e ela tremia, cansada de uma noite inteira a iluminar, a não me deixar perder o sentido das coisas na escuridão. Tive medo. Medo de perder aquele amor, o mais brilhante, o mais frágil, o mais efémero... Aproximei-me e pedi-lhe que ficasse. Tremia por cada pedaço de brilho que sentia perder-se na noite. Pedi-lhe baixinho que não me deixasse. Verti lágrimas e por instantes a cera também me desceu pela cara abaixo. Continuei a implorar. Numa dessas preces, o sopro que a minha voz receosa soltou, teve a força do vento, e foi o pedido desesperado de que ficasse... que a extinguiu de vez. Já não havia fósforos que a trouxessem de volta.

Damon at 2:15 da tarde

domingo, abril 13, 2003

Às vezes, falamos. Lançamos no ar chamas de dúvida, certezas em forma de pergunta. Nem sempre sabemos o que havemos de dizer. Perdemo-nos no tempo das letras que mastigamos e que teimam em não formar sequências lógicas, portanto, palavras.

Às vezes, precisamos de abrir a boca para comunicar. Lançamos no ar setas de letras que nem por isso são sempre certeiras. Não como os mísseis. Felizmente não sabemos fazer guerra. Pensando bem, falamos de mais.

Não precisamos das palavras. Aprendemos a química que não existe em tabelas periódicas. Aprendemos a química que não se lê, que não se escreve, que não se fala. Aprendemos a química que os cientistas desconhecem. E comunicamos sempre.

MANUAL DA COMUNICAÇÃO QUÍMICA - Benvindo aos meus olhos.

Damon at 3:48 da tarde