lkkk lkjhg
sábado, janeiro 17, 2004


Progressivamente, como eu digo. Quase sem que o mundo se aperceba. Apenas eu e alguns paparazzi que rondam a porta do meu quarto em busca de sangue visível. Claro que apenas levam daquele transparente que cai dos olhos, mas eles insistem.
Um dia, vais acordar e perceber que todos aqueles dias em que rimos de corpo inteiro não passam de recordações encerradas em livros agrafados, com capas feitas com colagens, ou cassetes onde as vozes fazem o favor de mostrar a felicidade que um dia existiu. Nesse dia, vais lembrar a campainha do telefone, as frases típicas que fomos acumulando e a cafeína quente que derramámos em conversas de todas as cores e formatos. Nesse dia, vais-te aperceber de que tudo mudou, há muito tempo. Progressivamente, como eu digo.
Nesse dia, vais-te lembrar e vais-te esquecer, adormecido na pele quente de alguém encostado a ti.

Damon at 3:25 da tarde

sexta-feira, janeiro 16, 2004



sei lá se a chuva algum dia vai parar.
sei que o ar cá dentro asfixia e que a escuridão cega.
e que o silêncio das bocas de incêndio me corta os ouvidos numa dor aguda.
não quero assassinar mais uma sexta-feira.
não quero ter medo do sábado.
e pavor do domingo.
quero que nasça um sol nocturno.
uma lua cheia serve.
e um chão onde quatro pés de cada vez dêem os passos precisos
para alcançar a praia.
sei lá se a chuva algum dia vai parar.

Damon at 9:33 da tarde




As feridas

Imagina as feridas
Dentro de mim.
Algumas conseguem ver-se
Do lado de fora,
Onde ainda se acendem as luzes
À noite.

Há quem atire pedras
E consiga acertar no alvo
E leve para casa o prémio
Que eu não consigo entender,
Está escrito na língua das pedras,
Das lágrimas
E dos bombardeiros.

Imagina as feridas
E o sangue que preenche as crateras,
Só o sangue,
Matando aos poucos
Num barulho de ácidos
Que riem.

Imagina as feridas
Do silêncio.
Algumas ainda conseguem ouvir-se
Como as pedras
E as lágrimas
E as bombas lançadas do ar.

Imagina o sangue corrosivo,
As horas sem beijos,
(Os beijos sem horas?),
O impulso que não se pode ter,
Não se pode sentir
Principalmente
Quando tens olhos que vêem
E deixam ver.

Principalmente
Quando tens olhos que choram
Quase sem dar por isso.

Damon Durham.

Damon at 12:14 da tarde

quinta-feira, janeiro 15, 2004



Não há tempo. Ele esgota-se em círculos, em frente a um computador, a ver ondas sonoras passar, a ouvir vezes sem conta as mesmas palavras e a contar segundos para um discurso que se quer jornalístico.
Não há tempo para pegar nos cd's emprestados e ir ouvi-los para o jardim, enquanto o vento nos faz desejar os braços de alguém. Ainda não consegui ouvir o Elliott Smith (desculpa, Joana!) Ainda não consegui ouvir a P.J. Harvey (desculpa, João!)
Queria passar a vir cá mais vezes, talvez pelo secreto desejo de compensar o tempo perdido em silêncio. Mas agora não dá. Amanhã, quando as ondas deixarem de ser manchas no monitor e puderem, enfim, rebentar na areia da praia. Eu quero estar lá, a apanhar bocadinhos de onda com as mãos em concha, com o meu discman carregadinho de grandes melodias.

Damon at 12:49 da manhã

domingo, janeiro 11, 2004



Cais

Para um nocturno mar partem navios,
Para um nocturno mar intenso e azul
Como um coração de medusa
Como um interior de anémona.
Naturalmente
Simplesmente
Sem destruição e sem poemas,
Para um nocturno mar roxo de peixes
Sem destruição e sem poemas
Assombrados por miríades de luzes
Para um nocturno mar vão os navios.
Vão
O seu rouco grito é de quem fica
No cais dividido e mutilado
E destruído entres poemas pasma.

Sophia de Mello Breyner Andresen.

Damon at 9:35 da tarde