lkkk lkjhg
sábado, março 15, 2003
A mensagem demorou muitos meses a chegar, quase um ano. «O que é que tens, Carlos?», em letras pouco humanas no visor do meu telemóvel. Fez-me frio. Fez-me demasiado renitente. Não me apetecia responder à letra de uma máquina, à voz escrita de um bocado de plástico. Demoraste muito tempo a perceber que a vida acontece e nem sempre o faz para a frente. Às vezes, reverte-se o sentido das coisas, os ponteiros do relógio fazem inversão de marcha e nessa fuga apressada, há palavras que se perdem no contrário das horas, as Horas de Virginia Woolf e de Mrs. Dalloway. Não bastou o meu olhar demasiado cansado para vinte e dois anos, as minhas mãos pouco gastas a pedirem rugas, a pele frágil incaracterística de um moreno descascando as folhas como se de um outro outono se tratasse. Tens a carne intacta ainda. Dos teus seios ainda não jorrou alimento. Dos teus lábios ainda não saltaram palavras tristes de quem já lá esteve e percebeu. «O que é que tens, Carlos?». Estou aqui, onde devia estar, entre folhas de papel e pó e notas de música que nunca sobem para além do céu. Estou aqui, onde não me vês, hesitante entre a resposta que lerias se eu ta enviasse via sms e a que te estou a dar agora e que não vais ler porque não me conheces. Apetece-me dizer-te «vem cá se me queres conhecer, porque sei que não vais gostar, nunca gostas de homens sensíveis, és demasiado baixa para tocar as nuvens e sentir a chuva a cair-te pela cara abaixo, regando o teu corpo com maturidade.» Mas não o faço. Percorro datas que ainda hão de vir e percebo que as horas farão de ti uma mulher. Serás no futuro. Ainda não és. «O que é que tens, Carlos?». Basicamente, pouca coisa para além de ideias, pensamentos, paranóias, amigos e um amor presente que não posso oferecer. Basicamente, tenho um coração que discute a banalidade conjugal com um cérebro que reflecte a luz e a escuridão. Basicamente, tenho quem sou. E quem eu sou tu podes saber se vieres cá, passo aqui os dias a olhar o mar, o que quer que seja o mar. Duvido que gostes de mim quando cá chegares. Farás inversão de marcha como as Horas de Virginia Woolf e tudo será apagado.

Damon at 7:17 da tarde


Esta noite, havia um círculo de luz gigante à volta da Lua. Nunca tinha visto nada assim. Perdoem-me os cientistas intelectualmente avançados se o ocorrido é algo de perfeitamente banal mas eu nunca tinha visto semelhante. Ía a sair de casa, olhei para cima, para tentar perceber se vinha chuva (que normalmente, como já se devem ter apercebido, cai de cima) quando reparei na circunferência perfeita desenhada à volta da Lua. Peguei no carro e fomos até à Foz para ver se de lá também se via. Achei que era o sítio certo porque a) é à beira-mar e as coisas escritas no céu têm muito mais brilho nesses locais; b) as nativas da Foz estão bem familiarizadas com os círculos já que os usam pendurados nas orelhas. Confirmou-se o que eu previra. Ainda se via melhor. O que eu estranhei foi que ninguém reparasse no que eu acontecia. Depois lembrei-me de que os nativos daquela região do globo têm grandes problemas de visão por causa do cabelo à frente dos olhos. Por isso é que eles não reparavam naquele fenómeno de luminosidade. Pensei várias coisas: a) é desta que o mundo vai acabar, isto é uma explosão que se aproxima do nosso planeta em forma de pedregulhos e vamos ser todos mortos à pedrada, a não ser que o Bruce Willis vista uma t-shirt com a bandeira americana e pegue num berbequim um bocadinho maior do que o normal para nos ir salvar; b) começou a guerra no Iraque e isto é consequência do rebentamento de um dos palácios do Saddam que se esqueceu do gás aberto depois de pôr a chaleira ao lume para aquecer água para a botija; c) são os extraterrestres que se aproximam e nada nos poderá salvar, a não ser que o Presidente Americano se meta num avião para salvar o mundo, em contrapartida, se eles me levarem, vou finalmente poder conhecer o planeta onde o Elvis nasceu; d) é um novo holofote para chamar o Batman; e) é um buraco no ozono, o que até é bom para algumas raparigas que vão poder ficar morenas antes de dar por isso; f) é só um círculo gigante de luz à volta da Lua e não vale a pena questionar, vou antes fundar uma seita e juntar uns trocos para comprar uma emissora de rádio com locutores brasileiros; g) «tasse» bem.
A sério, havia mesmo um círculo de luz gigante à volta da Lua, esta noite.

Damon at 1:35 da manhã

quinta-feira, março 13, 2003

Redacção: Se eu fosse grande

Se eu fosse grande, gostava de ser locutor.
Para aparecer na televisão.
E depois fazia concursos.
Já sei o nome do meu primeiro concurso.
Vai-se chamar: Adivinha, Sabichão.

Carlos Luís, 9 de Março de 1988.


Damon at 11:49 da tarde


Não sei porquê, sinto que hoje podia dizer tanta coisa... Andou no ar uma sensação de déjà-vu permanente, até vi a Joana Maria que, segundo me disseram, corou à nossa passagem, o que deve ser bom, suponho. Vi pessoas que já não via há algum tempo que me falaram de outras que, penso, talvez não volte a ver. Disso falarei quando me der para escrever poemas críticos. Andei às voltas no jardim até agora, de discman na mão, ouvindo a minha última compilação que baptizei «Salvation Tears», um bocado a pensar nas lágrimas que fazem a vez de Exército de Salvação. Chorar nos filmes, por exemplo... Any way, hoje apeteceu-me partilhar a receita para fazer um cd melodicamente perfeito, triste e magnífico ao mesmo tempo. Sou eu o gravador de discos compactos, não sou?...

1.Suede - «Europe is our playground» (Somos uns brincalhões...)
2.James - «Five-o» (Que saudades de vos ver, é impossível terem acabado)
3.The Smashing Pumpkins - «Thirty-three» (Combóio, a caminho de Lisboa, depressão versão 2000)
4.David Bowie - «Fantastic voyage» (A canção perfeita para iniciar uma compilação sobre a vida de alguém)
5.The Smiths - «Last night I dreamt that somebody loved me» (À espera da mudança para «Last night somebody told me she loved me»)
6.The Cure - «Plain song» (A caminho do combóio, lágrimas, depressão versão 2000)
7.Goldfrapp - «Paper bag» (...)
8.Blur - «No distance left to run» (Oiço-a sempre que tudo acaba, ou seja, sempre, até hoje.)
9.Echo and The Bunnymen - «Nothing lasts forever» (Idem aspas)
10.Lou Reed - «Perfect day» (Não queres aparecer por cá, podíamos ir tomar uma sangria - apesar de eu não gostar - ou dar de comer aos animais no zoo...)
11.Pulp - «Roadkill» (Jarvis, grande tarado, aparentemente esqueceste-te de falar de sexo nesta canção)
12.Coldplay - «Sparks» (Escrever poemas chamados «Do nevoeiro» no jardim, às cinco da manhã, em Junho, logo a seguir à despedida do nosso Castelo com acento de circunflexo)
13.Trash Can Sinatras - «I know it's over» (original dos Smiths; «I don't know where else to go»)
14.Elvis Costello e Anne Sophie Von Otter - «This house is empty now» («Maybe you will see my face...»)
15.Peter Murphy - «A strange kind of love» (Muitas, muitas, muitas voltas à volta da árvore no centro do jardim...)
16.The Lightning Seeds - «Thinking up looking down» (A caminho de Sintra, turma horrível, sensação pior, 1997, l'année terrible)
17.Aimée Mann - «Wise up» (Magnolia, chuva de Sapos, o sorriso da rapariga no fim do filme...)
18.Bryan Ferry - «This love» («I think I'm gonna fall again...» Haven't I yet?!)

E pronto, agora, vamos todos deixar as estrelas lá em cima, elas desaparecerão devagarinho. De manhã, o mundo estará pintado das cores do costume, e teremos um sorriso na cara porque senão, (quase) ninguém repara em nós. Vemo-nos amanhã.

Damon at 12:38 da manhã

terça-feira, março 11, 2003

«Nobody said it was easy...»

Chris Martin, o que é que estás para aí a dizer?

Ó merda que navegas nas águas da piscina de Gueifães e que não me deixaste nadar, hoje!
Ó merda de vida!

Damon at 7:07 da tarde

segunda-feira, março 10, 2003

eu, Tu e as estrelas

As estrelas vieram ver-nos, esta noite,
Lembrar-nos que a vida não cabe toda
Nas páginas pingadas de tinta dos jornais,
No olhar de vidro a cores dos telejornais.

Há um sopro lento no meu pescoço
Enquanto caminho, olhando o mar,
Navegando na memória recente do teu olhar,
Vendo reflectir nas águas o sorriso
Que roubou o brilho à Lua, esta noite.

Sabemos os dois onde estamos,
De que cais partimos um dia,
Onde chegámos na barca comum,
Por cima de nós, as estrelas são as mesmas,
Os sonhos talvez não.

Sabemos os dois quem somos,
De onde viemos, quando viemos,
E temos nos olhos o brilho dos sonhos,
Conheço faróis que se apagariam
Para te deixar passar...

Fui ver as estrelas, esta noite,
Reconheci no céu, o brilho do teu rasto,
Sei que passaste por aqui,
Sei que olhaste para mim
Porque a noite teve a cor do dia, por momentos,
Julguei que te podia tocar.

Desliguei a televisão,
Queimei os jornais na cauda de um cometa
E passei a noite contigo,
Deitado na Terra, de braços abertos
Abraçando o céu.

Damon Durham.

Damon at 10:13 da tarde