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segunda-feira, abril 19, 2004
Cançao do momento: Ilya, «Soleil, soleil»
Frase do momento: «Ola, Sr. Inverno!»

Hope Hospital, Manchester, Abril de 1980

No próximo sábado, vou nascer. Vou ver a luz do dia e sentir-me aconchegado nos braços de uma enfermeira escocesa, sardenta. Avisaram-me à ultima da hora que ia ter que saltar cá para fora um mês mais cedo do que o previsto. Uma maçada… Por um lado, já estou farto de me alimentar sempre da mesma coisa. Por outro lado, isto aqui parece-me bem mais acolhedor do que o mundo dos «grandes».
Em princípio, se tudo correr como previsto, vou passar alguns meses a ser empurrado num carrinho pelos parques verdes de Salford, particularmente aquele que se vê da janela do escritório onde o meu pai aparentemente trabalha. Quando me estiver a habituar a humidade do clima inglês e ao leite de soja do Tesco, já sei que me vão levar para um país distante onde se conduz pela direita apesar de todos andarem pela esquerda e onde todos os carros têm alguma coisa pendurada no retrovisor. É o país dos meus pais. Chama-se Portugal e pelo menos parece ser bastante mais quente…
O meu avô paterno, doente, é a razão da nossa mudança. No fim, poucas recordações vou ter dele, já que morrerá quando eu tiver dois anos.
Com três anos, vão-me inscrever no Lúmen, para eu fazer a pré-primaria. Vai haver lá uma funcionária a quem vou chamar «tio». Quando ela me perguntar «e porque não tia?», vou responder «porque pareces um homem…». Lá, vou conhecer o Miguel, que me vai acompanhar na Primaria e um ano na Preparatória e que vai ser o meu melhor amigo (sim, aquele que agora passa por mim na rua e não me vê, coitado…). Com cinco anos, vou dizer aos meus pais que estou apaixonado por uma Ana que faz anos no mesmo dia que eu e que não me vai ligar nenhuma. Aliás, eu só vou às festas de anos dela porque a mãe dela me vai convidar. Vou ser um miúdo tímido com quem quase ninguém brinca mas vou ser feliz, nesta fase. Nos tempos livres, vou construir casas com Lego e arrumar os carrinhos nas garagens debaixo dos móveis, achando sempre que cada família deve ter pelo menos um carro pequeno, um carro familiar, uma «space wagon» e um jipe. As vezes, também vou rabiscar papéis, fingindo que sei escrever, e entrevistar pessoas com uma caneta em vez de um microfone.

(continua)

Damon at 11:49 da tarde