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quinta-feira, janeiro 29, 2004


Jardim de destroços

Pareceu-me ouvir a voz
Dos fracassos mais ou menos longínquos
Mas não o suficiente
Para que as suas sombras se espalhem
Por toda esta terra inflamada de lágrimas
E de folhas a quem foi sugada a vida.

Pareceu-me sentir, na cabeça,
A mão sábia e habitual das árvores,
Lembrando que o Inverno ainda agora começa,
Os glaciares ainda nem sequer chegaram
E a neve é apenas um orvalho,
As dores nos ossos
Ainda hão-de os fazer estalar
Como o vidro
E as pessoas demasiado frágeis.

Há aqui uma fonte
Sepultada na terra
Onde antes havia água.

Dos braços da fonte alguma vez
Jorrou um qualquer líquido feliz,
Uma festa de salpicos
Que mataram a sede às plantas
E aos poetas.

O lixo esquecido
Descansa em paz,
Sedento de ser mais do que isso.

O lixo esquecido
Um dia foi importante
E coube nas mãos de alguém.

O lixo esquecido
Percebe-me.

E as folhas mil vezes calcadas,
Transformadas em cinza
Sem que o fogo alguma vez se lhes tenha pegado…

Mas a solidão também queima
E arde e golpeia e as folhas
São pedaços de gente
Que um dia caiu do céu,
Ficou presa nas árvores
E um dia sucumbiu.

Ninguém rega este meu jardim,
Ninguém reanima o coração resignado de resina
Das árvores,
Ninguém se alimenta dos seus frutos tristes.

Ninguém se senta ao lado
Das árvores,
Neste banco curvado das vidas que passou
Vazio.

Ninguém escreve poemas
Com as cores escurecidas deste chão
Onde um dia alguém dançou
(Eu sei, bem vi os passos
Marcados à volta da fonte
E os sorrisos enamorados
Marcados a canivete
Nos troncos mortos dos pinheiros).

Pareceu-me ouvir a voz do tempo
A abrir-me as portas do jardim,
A convidar-me para entrar e sentar
E em seguida um choro ecoou
Para que os meus ouvidos me convencessem
A morar aqui
Como mais um dos destroços,
Como as pedras, as árvores, o pó e as sombras.

Damon Durham.

Damon at 6:12 da tarde